two snakes [flashback]

Mikkel era um bom homem. Era isso o que eu dizia para mim mesmo todos os dias. Ele era atencioso e, desde que nos conhecemos, eu havia aprendido a confiar nele. Eu era um telepata ora bolas, podia ver suas intenções e o seu amor por mim era real, isso eu podia afirmar. Mentiras era algo inexistente para mim agora. Com os meus poderes, auxiliava meu esposo em suas reuniões e qualquer um que ousasse se voltar contra ele ou conspirar contra o Clube era desmascarado. Eu era útil. Vivia sempre vestido em látex branco, objetificado para todos e sempre lindo. “É preciso, meu amor, eles o acham perfeito, um anjo para todos brincarem”, dizia ele em meu ouvido quando estávamos em nossos aposentos. Mesmo com aquele pensamento deturpado, ele me amava. Via isso em sua mente.

— Venha, querido, temos um novo membro, acredita nisso? Ele é um forte candidato a Bispo Negro. — Comentou Mikkel com um sorriso, terminando de ter sua barba feita por mim, a lâmina sendo segurada firmemente em minha mão.

— Mas por que ele não começa como peão? Você me disse que todos ingressam como peões primeiro no Círculo Interno. Por isso sou peão ainda. — Comentei, unindo as sobrancelhas em desconfiança. Quem poderia ser esse novato para receber uma patente tão alta sem nem começar por baixo como todo mundo?

— Meu amor, quantas vezes eu precisarei lhe dizer... — falou Mik com serenidade, retirando a lâmina de minhas mãos com delicadeza, a outra mão retirando o excesso de espuma do rosto. Ele me beijou a testa, afagando meus longos fios loiros. — Você não é um peão, somente meu esposo e o servidor de bebidas do nosso clube. No máximo nosso dançarino pessoal. Agora ande, vista a nova fantasia que lhe comprei sob medida e me acompanhe.

Segurei com força o objeto em minhas mãos, engolindo o choro no fundo da garganta e baixando a cabeça, assentindo positivamente para o meu marido. Ele iria pagar por isso um dia.

Desci as escadas com meu esposo trajado como um rei, com direito a um belíssimo terno e uma capa, diamantes adornando-a e um broche que deveria valer o PIB de um pequeno país. Ele estava lindo. Eu, entretanto, usava botas, vestia uma calça de couro branco e jaqueta de mesma cor e tecido, com nenhum zíper na mesma – o que expunha meu corpo para todos ali. Sentia minhas bolas amassadas e meu pau podia ser visível para qualquer um, mas Mikkel sequer se importava – como ele havia dito várias vezes, eu era o brinquedo do Clube, sequer eu era um peão; somente um objeto para diversão. Os portões foram abertos e uma figura surgira na porta: quem seria?

— Marshall, olá! — abrindo os braços, meu esposo fora cumprimentar o homem, abraçando-o vigorosamente. Fiquei quieto, como era de meu feitio e também obrigação.

Um turbilhão de emoções se passou em minha mente agora, aquele convite inesperado de Ambrose me deixou estático. Ele queria porque queria que eu fosse o protagonista de uma missão suicida porque ele não podia fazer isso. Ele havia me ameaçado simplesmente para entrar nessa... Eu o amava, mas isso era o cúmulo... Ele estava me forçando a fazer o que eu não queria.

Eu só queria fugir dali, mas não consegui... Eu ao menos consegui me despedir dos meus melhores amigos. Eu sentiria muitas saudades de Ethan e Hank, principalmente trabalhar ao lado deles. Éramos o trio original e agora teríamos caminhos separados.

Agora cá estou aqui aqui num carro indo diretamente para Manhattan, justamente na sede do clube do inferno onde eu me apresentaria como o novo bisco negro, cargo este que Ambrose conseguira para mim após mexer uns pauzinhos dentro do círculo interno na qual ele tinha uma cadeira garantida.

Essas pessoas só se importavam com poder e status e eram apenas os membros da mais alta sociedade que estavam ali. Eu estava me perguntando pprque eu? Eu jamais teria todo o dinheiro que eles têm, eu não almejo poder... E muito menos status. Então porque eu sou a escolha perfeita para esta missão? Quais eram as verdadeiras intenções de Ambrose para comigo naquele clube?

Inerte em meus pensamentos, nem me dei conta de queno carro havia sido desligado. E então a porta fora aberta, sai rapidamente deixando meu look a amostra. Um terno extremamente elegante e todo preto. Eu não poderia negar que aquela cor me fazia bem, podia até mesmo defini-la como a minha predileta.

Caralho aquele lugar era magnífico, a sede do clube do inferno era simplesmente uma mansão. Como seria por dentro? Era possível até mesmo dizer que ela maior que a Academia X. Meu deus.

[...]

Eu me preparei muito antes de entrar naquela mansão, ainda assim meu corpo estava ofegante, era possível até mesmo ver gotas de suor serem derramadas de meu rosto e eu me limpei rapidamente ao meio em que eu tentava manter a calma. Enfim adentrei ao recinto e um homem extremamente elegante logo me cumprimentava com um repentino abraço.

Ei cara quem te deu permissão para tal? Eles eram sempre assim tão formais em público ou eram só duas caras mesmo? Acho que eu ficaria com a segunda opção. - Er... Olá! Você deve ser o Sr. Mikkel, estou certo? - Exclamei enquanto tentava expressar um sorriso ao homem. Também não pude deixar de notar que ao seu lado estava um homem extremamente vaidoso e com um visual bem intrigante.

Ao primeiro contato visual ele parecia ser bem importante ali, quem será que era ele afinal?
 

O rapaz tinha fios negros e era dono de uma beleza instigante, com olhos donos de mistérios ocultos e um tanto quanto hesitante. Ele parecia não estar gostando dali, haviam segredos nele e minha mão direita segurou a de Mikkel, num aperto firme para chamar a atenção do mesmo. “Há algo de errado”, falei para ele em sua mente, entretanto, o mesmo me ignorou enquanto conversava com o novo Bispo Negro. Engoli em seco, porém me limitei a sorrir educadamente para o rapaz.

— Sim, sou eu mesmo, seja muitíssimo bem-vindo ao nosso Círculo Interno. Precisamos de alguém com as suas habilidades, Sr. Lestrange. Este é meu esposo, o Sr. Frost, o que precisar pode falar com ele. — Mikkel, cordial e caloroso como sempre, logo retirou o celular de seu bolso, atendendo-o e nos dando um espaço para conversarmos.

Essa era a minha chance. Dei alguns passos para me aproximar de Lestrange, mas fui interrompido por uma empregada que nos trouxe taças de champanhe. Peguei uma, bebendo-a e esperando que ficássemos a sós mais uma vez. Mal podia esperar para encurralar aquela serpente e obrigá-lo a falar toda a verdade.

— Então, Sr. Lestrange, de onde você é? — perguntei com um largo sorriso amigável. Era fácil fingir gostar das pessoas quando se vive com o Clube do Inferno – afinal a maioria são serpentes falsas.

— Bem, tenho de ir, é uma reunião importante a que tenho. Querido, apresente o nosso Clube ao Sr. Lestrange, sim? — Beijando-me nos lábios, fui deixado a sós com o novato e, unindo as mãos e dando um pequeno sorriso, pisquei o olho para Marshall.

Quase que automaticamente, envolvi meu braço esquerdo no direito do rapaz, conduzindo-o pelos compridos corredores da mansão. Estávamos realmente a sós, a maioria dos membros surgiam somente quando realmente necessário, ou seja; reuniões, festas e orgias, às vezes.

— Veja, temos um jardim — sorri, sendo o mais simpático que eu conseguia, apontando para o mesmo por uma das janelas. Apertei um pouco mais forte o braço do outro, ficando a centímetros de sua face. — Quem você é de verdade e o que quer conosco, Marshall? Você pode se abrir comigo, mas se não quiser vai ser pior, posso entrar no seu subconsciente e creio que não gostaria. Todos dizem que é doloroso. — Mordisquei o lábio inferior. Era excitante ameaçar pessoas.

Aquele loiro só ficava me olhando, o que me deixou de fato bem constrangido. O mesmo parecia querer puxar um papo comigo para tentar arrancar algo. Ele ficava me olhando o tempo todo, que cara estranho. Ele havia me perguntado de onde eu era... E agora? O que iria responder? - Eu? Eu sou daqui mesmo no Manhattan. Descobri a pouco tempo que sou um mutante. - Proferi para ele. Bem isso eu não havia mentido. Era a verdade, mas ele com aquele olhar penetrante parecia querer sugar todas as minhas informações. Eu já estava começando a me incomodar com aquele cara.

O marido dele, Sr. Mikkel logo se despedia dele com um longo beijo, eles pareciam estar apaixonados. Que fofo. Quando ele foi embora, Daniel piscou para mim. O que estava acontecendo ali? Seria um jogo dele? Tentar me seduzir?

Ele logo coloca seu braço sob o meu como se fôssemos íntimos e então saiu pela mansão para me mostra-la, eu acho que ele só queria se afastar o máximo possível das pessoas que estavam ali naquele saguão para tentar algo comigo.

Ele me mostrava o jardim e eu não podia deixar de se admirar, era realmente lindo. Bom foi só isso de lindo mesmo porque as coisas começaram a esquentar quando ele apertou o meu braço com força. Quem ele pensa que era? - Ei? O que foi? Porque está fazendo isso? Quem eu sou de verdade? Acho que meia palavra basta, Sr. Frost! - Gesticulei com raiva. Ele queria que eu contasse sob o meu passado e até me ameaçava dizendo que iria invadir a minha mente.

Ele estava sendo abusado e eu jamais permitiria que algo assim acontecesse comigo, nós tinhamos agora a mesma equivalência de cargos ali, certo? - Escuta aqui seu mutante idiota... Porque você não vai atrás do seu maridinho e me deixa em paz? Está intrigado comigo desde que eu cheguei, por acaso eu sou uma ameaça a você? Eu não quero brigas! Só deixe eu curtir a festa em paz, por favor? - Vociferei enquanto que pedi com educação ao rapaz. Eu esperava que ele fizesse isso e me deixasse em paz a partir de agora. Ele não pode descobrir os meus reais motivos aqui dentro.
 

Não conseguia levar aquele novato a sério. Sua entrada no Círculo Interno não havia sido sutil, muito menos bem feita; ele simplesmente havia entrado já em um cargo alto, sem cerimônias, aprendizados nem nada do tipo. Desconfiado, ia arranhando a superfície de sua mente, mas sem me arriscar a entrar lá dentro – não sabia o que me esperava, nem os poderes do rapaz ou o que ele era capaz de fazer. Ele era arisco, se defendendo e sendo agressivo para disfarçar o nervosismo. Ele escondia alguma coisa e eu não iria poupar esforços em descobrir o que era. Diante de sua agressividade, apenas olhei-o de cima a baixo.

— Eu fui designado para lhe fazer companhia, querido, e é exatamente isso o que eu irei fazer. Olha, não quero brigar também, mas você e a sua entrada no grupo não é normal ou comum. Todos aqui entram como peões, não importa se você é o Presidente da República ou o mutante mais poderoso do mundo. Você entrar como Bispo Negro só pode significar que alguém do Círculo Interno o colocou nessa posição, e só o Lorde ou a Lady possuem poder para isso. Nenhuma reunião foi feita para apresentá-lo, então… o que isso significa? O que faz aqui se passando como mais um novato? — pressionei-o, passando a mão por seus ombros e trazendo-o para perto de mim, quase como se eu fosse abraçá-lo. — Olha, pode confiar em mim, cara, eu sou telepata e poderia invadir sua mente e conseguir as informações à força. Mas… prefiro só perguntar, veja como posso ser bonzinho.

E era verdade; preferia não me arriscar a revirar sua mente e, quem sabe, me perder lá dentro. Queria descobrir sobre o rapaz, mas sem comprometer minha posição no processo. Se ele fosse realmente inserido no Círculo Interno pelo Lorde, então eu poderia entrar em maus lençóis.

Aquele garoto seria problema. Estava muito desconfiado para o meu gosto apenas por não concordar sobre a missão posição dentro do Clube do Inferno. Seria inveja? Bom se for isso, seria bom provoca-lo. - É uma pena você ter tanta inveja assim.... Veja se eu estou aqui, é porque de alguma forma eu vou ser útil né? E você? Parece apenas passar de capacho do Rei Branco... Será que você é realmente tudo isso? - Gesticulei colocando tudo para fora enquanto provava-o. Se ele iria tentar me manipular, eu faria pior.

O homem estava querendo saber demais sobre coisas que nem eram da conta dele. Tolo. Jamais descobrirá o meu objetivo, só passando por cima de mim e invadindo a minha mente, mas caso ele tente isso. As coisas vão ficar muito piores para ele. Tá achando que vai me intimidar dessa forma? Eu posso ser mil vezes pior, apesar de não demonstrar o meu verdadeiro eu. Mas o que é dele está guardado caso continue testando minha paciência. Eu  não quero ter que revelar o meu lado mal para ele.

Para ser sincero eu não esperaria que alguém do circulo interno do clube do inferno fosse ser tão chato a ponto de querer apontar coisas para mim daquela maneira. Ele parecia mascarar a sua verdadeira face quando seu "marido" saia de perto. Uma verdadeira cobra. Mas o que ele não esperava era que eu poderia ser também e era uma das mais peçonhentas. Uma personalidade que eu tentava esconder até mesmo dos meus amigos. Uma faceta cruel. Eu jamais quero demonstra-la para alguém. Mas Daniel... Ah Daniel... Você está brincando com fogo. Não me faça ter que monstra-la para você.

 

Marshall parecia ter o poder de não conseguir responder a nenhuma pergunta que eu fazia. Era como se ele fosse um sabonete escorregadio e minhas mãos fossem de óleo. Era impossível extrair qualquer informação dele. Eu podia pelo menos tentar invadir a sua mente, retirar tudo aquilo de que eu precisava, mas eu não queria fazer aquilo – por ora, pelo menos. Arranhava a superfície como um gato brincando com sua presa antes de comê-la, apenas observando e rolando por coisas simples, como um ruivo e um moreno que eram seus amigos e uma suntuosa mansão onde ele morava. Nada demais, por ora. Sua agressividade e sua lábia agressiva não seriam o suficiente para me ofender.

Sim, eu era apenas um mero peão, entretanto eu não podia me apegar a cargos importantes ou ter um ego frágil – coisa que acontecia com todos os outros homens e mulheres do Clube do Inferno, assim como a maioria dos membros do Círculo Interno, sempre preocupados com a imagem e com a fama. Não. Eu precisava saber exatamente qual o meu lugar, aprender a como usar minha posição ao meu favor e melhorar as minhas jogadas para subir na hierarquia. Saber o meu lugar não significava que eu gostava dele ou que iria me conformar – e eu tinha a paciência de esperar o momento certo. Baixei minha cabeça ao ser “ofendido”, curvando os lábios em uma falsificada tristeza e levei a mão a boca, lágrimas descendo por minha face.

— Eu sinto muito por pensar isso de mim, Marshall, eu realmente sinto muito. Eu só quero o bem do nosso Círculo Interno, me desculpe por desconfiar de você. Prometo não fazer isso de novo, eu só... — limpei as minhas lágrimas com os dedos indicadores, sorrindo sem jeito. — Eu fui aceito aqui como eu nunca fui antes, entende? Eu saí das ruas logo cedo e Mikkel foi o único que me estendeu a mão. Isso para mim não é apenas um clube de diversão nem uma forma de alavancar a minha carreira, é um lar, uma casa onde eu pude me desenvolver e evoluir como ser humano. Não fosse por eles e eu estaria morto numa vala qualquer. — Comentei, pigarreando e então avançando para a direção dos jardins com o moreno em meu encalço.

Eu não esperava que ele confiasse em mim, muito menos que fôssemos virar amigos do nada e nos tornássemos íntimos. Entretanto, eu queria de verdade que ele acreditasse em mim, pois o que eu dizia era verdade: eu precisava do Clube do Inferno e não podia perder aquilo por nada. Eles eram tudo o que eu tinha.

— Eu só quero conhece-lo melhor. Acha que podemos recomeçar... mas como amigos? — mordisquei o lábio inferior, rindo sem jeito e segurando sua mão como um mero jovem apaixonado. É, eu era bom.

Das coisas que eu jamais não queria que acontecesse quando aceitei essa missão de fato era alguém no meu pé o tempo todo. Qual a finalidade dele em querer saber mais de mim? Para quais meios ele utilizaria daquelas informações? Ele era esperto e intrigante, mas eu não era bobo e não seria trouxa o suficiente para cair em seu jogo mental. Ele provavelmente quer descobrir algum podre meu para tentar usa-lo contra mim, mas e se o jogo virasse? E se eu tentar descobrir algo dele o suficiente para mante-lo sob os meus pés e ele não me incomodar mais?

Depois do que eu tinha dito a ele ele pareceu estar meio ofendido no mim, não sei não... Ele parecia estar tentando me manipular com aquela ceninha patética. Ele então começa a chorar e eu por um mísero momento até achei que aquelas lágrimas pudessem ser falsas, mas eu me controlei ao máximo para entrar naquele jogo dele. Se ele podia joga-lo, eu também posso. É a regra do jogo, certo? Vence o mulher manipulador e estava na cara que ele não parecia ser tão manipulável assim.

Tá quem eu estou querendo enganar. O mutante umbracinetico que se deixou levar-se pelas ideias mirabolantes e surreais de Ambrose. Como ele tentou me convencer a entrar nesse covil de cobras e seres totalmente influenciáveis pelo poder e fama? Eu de fato eu não buscava ser famoso, ser conhecido mundialmente.

Voltando a realidade, observei-o atentamente. - Porque está fazendo isso? Porque você quer que nós sejamos amigo agora? O que quer de mim, Frost? - Dissera friamente observando-o com minhas sobrancelhas arqueadas. Ele achava mesmo que eu acreditaria nele? Coitado. Ele podia controlar a minha mente se quisesse, mas não iria extrair nenhuma gota de segredos meus.


Após eu retrucar ele começava a contar sobre como o Mr. Mikkel o ajudou a sair das ruas e a entrar ali. Fazendo ceninha meticulosa para tentar conseguir compaixão. Um ponto estratégico, básico e patético. Aquele Daniel era patético demais, mas eu iria tentar dar uma chance a ele. Ele não me engana. Ele era enigmático e eu estava de fato interessado em descobrir mais sobre ele. - Tudo bem... Eu não acredito que possamos ser amigos, mas eu acredito em recomeços... Me desculpe! "Amigos" então? - Dissera extendendo sua mão ao rapaz enquanto que parei logo em seguida de andar pelos jardins. Queria saber até onde aquele papo iria chegar.