Pearly Gates look more like a picket fence

Se eu tivesse algum melhor amigo que me conhecesse tão bem quanto eu mesmo, esse amigo provavelmente estaria me dando um sermão sobre a futilidade de excluir o aplicativo de pegação numa noite apenas para reinstalá-lo na manhã seguinte. Como não tenho nenhum melhor amigo, não tenho ninguém para me criticar enquanto aceito o convite do coroa bonitão que me chamou para uma pizza no Brooklyn mais tarde. Se tudo der certo, eu vou poder ter uma noite de comida grátis e sexo fácil livre de qualquer transtorno. Afinal, já me basta a roubada colossal na qual entrei por causa do cara com quem transei ontem a noite.

O filho da mãe provavelmente teria sido a próxima vítima da mutante maluca que andava matando homens infiéis pela cidade a mando de algumas esposas cornas e frustradas. Tenho arrepios só de lembrar que tudo foi encomendado pelo próprio namorado do Edward, ou Albert ou qualquer que seja o nome dele. A pior parte é saber que eu corri sério risco de ser exposto como mutante quando me vi forçado a lutar contra aquela cabeluda psicopata num beco escuro na esquina de casa. Isso se eu não tivesse morrido tentando bancar o herói, mas tudo terminou bem graças à Darkchylde, Belasco ou qualquer que tenha sido o demônio do Limbo que me agraciou com tamanha sorte de sair dessa roubada praticamente ileso e com minha identidade intacta.

E se for pra considerar que o Francis, embora de certo hospitalizado, ainda está vivo e que a tal mutante assassina que vinha causando problemas pro NYPD já deve estar sob custódia do governo e com algumas queimaduras de terceiro grau, o meu quadro é infinitamente melhor. Mas isso é passado e só o que eu quero agora é sossego. Sossego e esquecer isso tudo. E um pouco de comida grátis e sexo fácil com um coroa bonitão, afinal, ninguém é de ferro.

Termino meu expediente na livraria onde trabalho e após fechar o caixa e deixar Billy encarregado de fechar a loja, vou direto para casa me arrumar para o meu encontro casual. Ponho uma roupa bacana e não tardo até me encaminhar ao metrô. O lado ruim de ser assumidamente galinha é que depois de ficar rodado na vizinhança você começa a ter que ir caçar mais longe. Detesto ir até o Brooklyn, mas o cara parece ser gostoso e ter grana. Não poderia pedir por mais.

Após rodar por alguns minutos procurando o tal lugar, encontro a maldita pizzaria quando minha barriga já rosna e uiva de fome. Adentro o restaurante e olho em volta procurando o bonitão. Quando meus olhos cruzam com o dele, estampo um sorriso sexy e convidativo em meu rosto ao me aproximar. - E ai, tudo bom? - Digo, já puxando a cadeira de frente pra o cara e sentando-me à mesa. Uma olhada rápida e percebo que ou ele se arrumou demais para um pizza, ou eu é que vim arrumado de menos. - Você é o "DiscretoDotadoReal", né? Sou o "SexWarlock". Ou pode me chamar de Alex. - Digo com um sorrio e estendo a mão para o figurão.

Vestindo:

O cara parece me devorar com os olhos ao me cumprimentar. Não fosse esse, tecnicamente, o fim esperado para este encontro, eu até estaria um pouco desconfortável com a postura do figurão. Eu simplesmente não costumo sair com caras como ele. Tanto que nem sei ao certo o que responder quando ele me pergunta como foi o meu dia. - Ah... Sem problema. Cerveja e pizza tá perfeito pra mim também. E, bem... Meu dia foi bom. - Digo e lanço um sorriso curto.

Ele me encara com o olhar de quem ainda espera por mais e eu então me obrigo a acrescentar. - Eu trabalhei o dia todo lá na livraria. Sou gerente da Logos em Yorkville, aliás. Depois eu saí de lá... E vim pra cá... E aqui estou. - Complemento com uma risada amarela, razoavelmente constrangido por ser pego de surpresa com uma pergunta que não havia sido de fato retórica. Isto só reforça o quanto este cara definitivamente não é do tipo com quem eu costumo sair. Tudo à respeito dele grita seriedade e formalidade. A própria pizza antes do sexo já deveria ter me servido de pista para sacar isso, mas uma vez na chuva só o que me resta é me molhar.

Antes que qualquer um dos dois possa dizer mais alguma coisa, o garçom chega enviado pelos demônios do Limbo e interrompe o fiasco de conversa que eu mediocremente tentei manter. Com o pedido feito e dois copaços de cerveja chegando logo em seguida, tenho tempo de me reorganizar enquanto trato dar um gole longo e saboroso na minha bebida. O simples sabor amargo na minha boca já me deixa bem mais desinibido e pronto para assumir novamente minha postura de conquista.

Estou prestes a lançar uma das minhas cantadas baratas que por qualquer que seja o motivo sempre funcionam quando o figurão me pega de surpresa novamente ao me questionar à respeito do meu nickname no aplicativo de pegação e sua alusão à feitiçaria. Pigarreio impulsivamente e abro a boca para dar a primeira resposta evasiva que meio veio à mente. Contudo, sem ao menos me dar a chance de desconversar, o bonitão lança uma afirmação que me mantém boquiaberto, porém mudo.

- Oi? - Pergunto após fechar os olhos e franzir o cenho com verdadeira estranheza. Não que a ideia de Elijah ser um mutante e um feiticeiro seja absurda, mas sim porque a ideia de ele TAMBÉM ser um mutante feiticeiro soa como uma coincidência infeliz demais para que eu engula sem ficar com ambos os pés atrás. - Que conversa é essa? Do que você tá falando? - Digo ainda incrédulo com o que acabo de ouvir. Minha mão se fecha com força ao redor da base do meu copo de cerveja e, mediante o olhar afiado e perfurador do outro, sou obrigado a dar um demorado gole na minha bebida para ganhar tempo e descobrir o que fazer a seguir sem parecer absurdamente suspeito.

Como se os seus poderes mutantes se resumissem na habilidade de me deixar ridiculamente surpreso e constrangido cada vez que ele abre a boca para dizer algo, Elijah me faz engasgar com a cerveja quando joga no meu colo uma cantada digna de uma das que eu mesmo jogo nos outros. À esta altura a risada que eu solto involuntariamente é de puro nervosismo. Embora eu preferisse manter meu olhar baixo, para não dizer que eu gostaria de enfiar minha cara no chão, eu me forço a olhá-lo nos olhos e, ao fazê-lo, não consigo evitar de analisar rapidamente sua postura e aparência com outro olhar. Meu sangue ferve.

- Você é da polícia? - Digo; meu olhar isento de constrangimento. Mesmo antes de sua resposta eu suspiro de forma pesada sem querer acreditar que eu tenha medito em outra maldita roubada. - Olha... Escuta só, eu não tô nem ai pra o que você acha que sabe ou acha que viu. Aquilo de ontem foi um acidente e eu só estava me defendendo, valeu? Não tô atrás de confusão! E outra, vocês deviam estar me agradecendo por eu ter pego aquela maluca com quem vocês aparentemente não conseguiam lidar. - Digo, baixando minha voz gradativamente a ponto de terminar a frase cochichando, ainda que sem perder as notas de raiva e nervosismo no meu tom.

- Quer saber? Tô fora! - Digo sem ao menos esperar por uma resposta e me ergo da mesa em um movimento brusco, me atrapalhando um pouco para afastar a cadeira e me apressando para dar o fora dali. Ainda volto à mesa e agarro o meu copo para terminar o resto da cerveja em um gole só. - Me deixa em paz, valeu? - Digo, olhando diretamente para Elijah e apontando o meu dedo na sua direção. Não faço ideia de quem seja esse cara, mas boa peça não deve ser. Só a forma dele me olhar fria e calmamente quase sem piscar já me dá calafrios o suficiente para eu não querer saber de nada sobre ele. Ainda que seja exatamente esse olhar profundo e misterioso que me deixe estranhamente excitado e confuso.

Os seus finos lábios se separam e eu então tremo nas bases, certo de que ele vai me derrubar aqui e agora com o que quer que ele diga a seguir. Mas se já estou na chuva... Não. Se já estou me afogando, não custa nada agarra a mão que ele me estende.

Vestindo:

Instintivamente contraio o meu tronco e ergo as mãos acima da cabeça em resposta ao barulho de explosões ao meu redor. Olho em volta assustado sem entender o que acaba de acontecer e sou novamente pego de surpresa, agora pelo barulho das portas se batendo. Pisco um par de vezes tentando ajustar minha visão à clara manifestação de energia bruta encobrindo a saída do estabelecimento. Não me leva mais que um segundo pra me dar conta então de que Elijah não estava blefando quanto ao seu currículo.

Ainda assim, saber que ele não é um policial disfarçado não me trás nenhuma sensação próxima de alívio, pelo contrário, sinto meu corpo se tornar tenso e meu coração se acelerar mediante o rumo que o nosso encontro amistoso tomou. A postura agressiva que o figurão assume também não me ajuda a desejar permanecer aqui por muito mais tempo. Contudo, não faço ideia de como dar o fora sem iniciar um tiroteio de superpoderes que provavelmente vai trazer o local abaixo. Embora aflito, encaro Elijah firmemente na tentativa de esconder o meu medo de morrer aqui e agora.

- Hã? Que merda você acha que tá fazendo? E quem diabos fala algo como "maricas" hoje em dia? - Questiono de forma retórica quase a revirar os olhos, mantendo-me parado de pé em oposição ao comando autoritário do outro que me ordenou a sentar como se eu fosse o seu cãozinho. Quem ele pensa que é? Meu adestrador? Posso até estar com medo demais para simplesmente virar as costas para ele e sair, mas não vou me submeter à esse papel. Sei que tenho que dizer algo e tenho que dizer logo, mas nenhuma réplica boa o suficiente cruza minha mente. Para minha sorte o outro rapidamente volta sua atenção para o atendente apavorado e de alguma forma usa seus poderes para dispersar o pobre rapaz enquanto afirma só estamos conversando.

Olho por cima do ombro para constatar que a porta continua lacrada pelos estranhos poderes do figurão e solto uma curta risada que mais parece um suspiro pesado. Porque ele estaria bloqueando a minha saída se tudo o que quisesse fosse conversar? O coitado do atendente se aproxima e recolhe os copos vazios, claramente se borrando nas calças como eu provavelmente estaria caso não pudesse no mínimo me defender de fogo com fogo.

Quando o jovem se afasta, eu inicio. - Escuta aqui. Eu não sei o que você pensa que sabe, ou o que você acha que eu sou. Mas eu te garante que você não tem a mínima ideia de quem eu seja ou do que eu possa fazer, então... - E cesso ao ser interrompido pelo garçom que voltou com mais cerveja. Tão rápido o garoto é empalado pelo meu olhar furioso, ele se manda quase tropeçando nos próprios pés e deixando a mim e Elijah à sós novamente. Antes que possa retornar, é o figurão que inicia um discurso.

Um arrepio percorre minha espinha enquanto ouço atentamente as palavras do bonitão. Não sei se isso é uma extensão dos seus poderes ou se ele realmente só é bom de lábia, mas o ponto é que sua proposta prende minha atenção. Óbvio que todos os meus alertas de cilada estão ativados nesse instante, mas no fundo, creio que não há tanto problema assim em ouvir. O cara é bonito, tem grana e tem uma proposta a me fazer. Qualquer coisa, eu posso simplesmente pular fora, não é mesmo? Sabendo exatamente o quanto eu vou me ferrar por fingir que acredito nisso, sento-me relutante e encaro-o fixamente por um instante antes de agarrar o meu copo. Inclino-o levemente, sem corresponder diretamente ao brinde, mas dando ao figurão um sinal verde. - Não ter que me esconder já seria um ótimo começo... Prossiga. - Digo rispidamente e dou gole longe e demorado na cerveja. Meus olhos fixos nos de Elijah. Minhas mãos suando. Meu subconsciente excitado com a grande probabilidade disso ser uma grande roubada.

Vestindo: